Lauren Mendinueta: “Podia deixar de escrever mas nunca poderia deixar de ler poesia”

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No âmbito da Festa da Poesia, que decorreu na Casa da América Latina, Lauren Mendinueta lançou o seu livro “A Vocação Suspendida”. A Casa da América Latina conversou com a poeta colombiana sobre este livro.

Este livro tem uma importância singular porque, tendo já sido publicado pela primeira vez em 2007, representa um momento importante da sua vida. Disse na apresentação que há a Lauren Mendinueta antes deste livro e a Lauren Mendinueta depois. O que é que isso quer dizer?

De facto, foi o meu primeiro livro a receber um prémio internacional de poesia em Espanha, prémio para a língua espanhola. Portanto, também nesse sentido faria um antes e um depois na minha poesia e um depois. E representa uma voz mais madura, a minha, depois de anos de escrita do livro, que reflete muito sobre o que significa ser poeta. É o meu livro mais publicado também, mais difundido, com seis edições. Portanto, é um livro muito importante.

Lançou onde primeiro? Na Colômbia ou em Espanha?

A primeira edição em Espanha, depois no ano 2009 na Colômbia e logo se seguiram outras.

Como dizia, o livro tem, então, alguns poemas que tratam dessa reflexão do que é ser poeta, mas não só.

Mas não só. Também a poesia à volta do tempo, um capítulo todo sobre o amor, a reflexão sobre o amor e o desamor também. E um livro que tem vários temas, várias vertentes.

Ou seja, quem ler este livro pode ficar a conhecer a poeta Lauren Mendinueta nas dimensões que ela trata poeticamente, é isso?

Penso que sim, porque é um livro onde aparecem os temas que mais me interessam e que continuaram a interessar ao longo do tempo: a vocação, a poesia, o tempo, o amor, o desamor, a memória. Todos estes temas que tenho vindo a desenvolver em livros posteriores estão já esboçados n “A Vocação Suspendida”.

Disse na apresentação, que não poderia viver sem a poesia e que nem sequer se conheceria sem ser poeta. A poesia no seu caso aparece como uma inevitabilidade?

Absolutamente. Até pelo facto de que, durante muitos anos, eu não consegui saber exatamente quem eu era, qual seria a minha “profissão”, e com a escrita, com a poesia, encontrei uma coisa que é muito importante, sobretudo para as mulheres em qualquer contexto, que é a voz. Ou seja, ter um espaço de escrita onde a minha voz possa ser ouvida era algo que era importante dentro do meu desenvolvimento como ser humano.

É colombiana, vive em Portugal há 17 anos. Este livro que encontramos aqui é de uma poeta colombiana e tem uma voz poética latino-americana ou acredita que tem uma voz poética universal e não local?

Espero eu que sejam os leitores e as leitoras a decidir se a voz é universal. Mas, com certeza, é a minha voz, que é o que mais interessa, penso eu, aos leitores e leitoras: encontrar uma voz que é verdadeira. É o que eu procuro na minha poesia. Um livro que comecei a escrever na Colômbia, depois continuei a sua escrita em Espanha e finalmente terminei de escrever completamente, penso que a versão definitiva, em Lisboa.

Mas encontramos a Colômbia no seu livro?

Não, não se encontra nenhuma paisagem que represente nenhum país em particular porque, na minha poesia, o mundo interior é o mundo que prevalece sobre todos os outros mundos, portanto não há América Latina, Espanha ou Portugal. Embora esteja a pensar agora que há um poema que é dedicado à Maria Helena Vieira da Silva, mas que escrevi na Colômbia antes de sequer imaginar que ia morar em Lisboa.

Há um lado interessante, por estarmos a falar agora da América Latina, que é o facto de ter escolhido viver em Portugal, mas ter uma espécie de missão que é divulgar, dar a conhecer, a poesia latino-americana. Teve uma participação importante numa edição que saiu em Portugal, para a qual antologiou poetas latino-americanos, as escolhas foram suas, mas agora tem um papel ativo na organização de encontros com poetas latino-americanos. Por que razão o faz?

Porque penso que é muito importante a minha posição de privilégio de ser uma poeta colombiana que vive em Lisboa, mas que mantém um vínculo muito forte com a América Latina, com a língua espanhola e língua castelhana. E portanto, faço aquela ponte entre os poetas do outro lado e os poetas deste lado para lá também. Não são só os poetas latino-americanos, são também os poetas portugueses, por exemplo, com as duas coleções de poesia portuguesa que eu dirijo para a Colômbia, Argentina e Espanha, onde também tenho feito um papel de tradução e de publicação de poetas portugueses.

Ou seja, é nos dois sentidos.

É nos dois sentidos e espero que continue a ser nos dois sentidos, porque vejo que em Portugal a poesia latino-americana é muito desconhecida e acontece exatamente o mesmo na América Latina e até em Espanha com a poesia portuguesa. Portanto, é uma missão que acho importante porque ambas as poesias são muito grandes, muito belas, e merecem conhecer-se entre elas também.

Usou a expressão “poesia latino-americana”. Nós leitores temos a ideia, em relação à literatura latino-americana, os romances, que existem algumas características que nós identificamos como sendo daquele lado do mundo. Na poesia também acontece isso? Acha que há algum elemento distintivo que nos leve a dizer “a poesia latino-americana tem estas características”?

A poesia latino-americana é como a poesia de qualquer lugar do mundo. É muito diversa, tem muitas vozes, muitas maneiras de se expressar e, sobretudo, penso eu, é uma poesia muito rica porque é muito diversa também. Nos nossos países, embora tenhamos a mesma língua como no caso do português, entre países podemos partilhar a língua mas depois a cultura é diferente. Portanto na poesia essa riqueza é muito interessante de ser divulgada.

O que é que a poesia lhe dá, pessoalmente e enquanto leitora?

Dá um prazer enorme. Sou uma leitora muito fiel de poesia, leio poesia todos os dias, e faço-o sobretudo pelo prazer que me dá o encontro com a linguagem da maneira tão rica que nos traz a poesia, tão profunda, que enriquece tanto a minha vida interior. Podia deixar de escrever mas nunca poderia deixar de ler poesia.


Entrevista realizada por Raquel Marinho

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