Yusmari Díaz Pérez: “A relação Cuba-Portugal é uma relação muito longa, de muita tradição, de muito inter-relacionamento”

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Yusmari Díaz Pérez, Embaixadora de Cuba em Portugal desde 7 de março, funcionária de carreira do Ministério das Relações Exteriores da República de Cuba.

Antes de qualquer outra coisa, creio que não conhecia o nosso país. Qual é a primeira impressão?

Ainda não conheço tudo, só alguns lugares. Conheço um pouco de Lisboa, muito pouco do Porto, Condeixa que já visitei, mas foi muito pouco o que conheci. A primeira impressão é que é um país muito amistoso. O português está sempre pronto a ajudar, está sempre pronto para dar um conselho, sempre muito descontraído mas respeitoso ao mesmo tempo. Sinto-me muito bem-vinda em Portugal, e isso é muito bom para qualquer um dos diplomatas que possam estar acreditados aqui. É esta a primeira impressão (risos). O português está sempre com um sorriso mas ao mesmo tempo é sempre muito respeitador, e isso é muito bom.

Comemorou-se no início do mês de maio o 103º aniversário das relações Cuba-Portugal. Por causa da pandemia e por causa da explosão no hotel da cidade de Havana as celebrações foram anuladas mas é uma relação longa entre os dois países. O que é que pretende fazer aqui na sua ação como diplomata?

Como diz, é uma relação muito longa, de muita tradição, de muito inter-relacionamento sobretudo entre os governos mas também entre os povos, uma relação que nunca foi interrompida apesar dos tempos. Nesta altura é preciso, primeiro, continuar esse relacionamento positivo, manter esse relacionamento entre os dois países e entre os dois povos. Depois da pandemia, em que ficámos dois anos numa situação de crise para todos, acredito que a maior força estará em manter esse relacionamento, sobretudo em áreas de cooperação que podemos ter como a área da saúde, da educação, da cultura, e também a área económica e comercial. Portugal tem uma abertura face à internacionalização das suas empresas e hoje Cuba tem também um programa nacional de desenvolvimento que permite ver a potencialidade de ambos e olhar para a frente, caminhar juntos na medida das possibilidades, e acredito nisso. Não menos importantes, também teremos outras áreas de relacionamento entre instituições jurídicas, entre o comité olímpico, e sobretudo também na área cultural. Fala-se sempre de turismo, claro que um voo direto seria muito bom, é algo em que acreditamos, mas acredito também que para o relacionamento entre os povos o que se faz com a cultura, o conhecimento, a arte, a literatura é algo que fica para sempre.

Creio que a Embaixadora em um especial apreço pela área cultural.

Tenho um especial apreço ainda que a minha formação não seja de cultura, eu sou advogada de formação, inclusivamente fui advogada de crianças. Mas acredito que a cultura abre todas as portas, permite até ter um diálogo franco em qualquer das perspetivas que tenhamos. Há algum tempo eu li uma frase de Fernando Pessoa – “Não é a cultura senão o aperfeiçoamento subjetivo da vida”- , e é isso. Nós percebemos, nós fazemos, nós vamos para a frente com esse aperfeiçoamento da vida e tentamos aquilo em que acreditamos. Então, isso é muito bom nesse sentido.

Então já temos aqui várias áreas que referiu, que gostaria, digamos, de trabalhar nas relações diplomáticas Portugal-Cuba, que se prendem com as relações culturais, económicas, ou comerciais. Sei que alguns setores podem ser, por exemplo, o agroalimentar, referiu isso numa outra entrevista…

Sim, há áreas com muito potencial e tem-se sempre trabalhado muito. A primeira coisa que referi é que temos de continuar o que já está feito e isso é importante.

Manter.

Manter. É muito importante dar continuidade e talvez dar uma força maior…

Com o tal voo direto de que falou?

Talvez seja isso, é algo que foi feito no seu momento, há muito tempo. Temos de ver que possibilidades reais existem. Mas na área do agroalimentar, por exemplo, há muito potencial. Também na área de biotecnologia, distribuição, médicos, e sobretudo em investimentos, à procura de investimentos portugueses em Cuba para fazer uma exportação desde Cuba que seja benéfica para ambos.

Já há, digamos, uma colaboração ao nível da saúde com os médicos cubanos.

Sim, foi feita há algum tempo, a pedido de uma comunidade. Estamos abertos a qualquer colaboração sempre que seja boa para as duas partes, e se Portugal precisar também estamos à disposição. Não é algo de que se fale neste momento, é algo em que temos sempre um potencial, como também temos potencial em fazer alguma cooperação trilateral entre Portugal, Cuba e alguns países da área de África, comunidades de língua portuguesa na qual Portugal tem uma relação cultural intrínseca e histórica, e nós também temos essa união histórica, apesar de estarmos nas Caraíbas.

Que colaboração triangular poderia ser essa?

Podia ser a continuidade na área da educação, na área da saúde, na área do desporto que é muito importante, mas teremos de avaliar essa disposição e vontade. Agora estamos a começar, tenho algumas experiencias de anos passados e é preciso saber se existe alguma possibilidade em cima da mesa, se existe vontade e abertura para o fazer. Nós estamos agora a trabalhar com o Instituto Camões, com o leitorado português que foi criado em Havana, e isso permitirá também abrir para Cuba a história de Portugal e da cultura portuguesa, ao mesmo tempo que também queremos dar uma abertura de Cuba que não seja só o que se conhece, que são as praias e o tabaco. Há muita coisa que também devem conhecer.

Está a falar da cultura cubana?

Da cultura cubana que é muito ampla.

E o que é que poderia fazer no sentido de divulgar cá em Portugal a cultura cubana?

Primeiro temos de encontrar espaços, a Casa da América Latina é um desses espaços. Há que encontrar espaços certos, colaboradores certos para isso, e só agora estou a perceber o que se pode fazer, também de acordo com o gosto português. O português gosta de boa música, já percebi um pouco, mas gosta também de literatura, gosta de cinema. Então, talvez se possa fazer um ciclo de cinema, algo do que não se conhece ainda, porque já se fez muito, é só tentar dar um pouco a visão mais atual e de outro tipo de música cosmopolita, como existe em Lisboa, mas em Havana e Cuba também. Como Portugal, são países pequenos com muitas coincidências do ponto de vista cultural, temos de encontrar os pontos certos onde nos podemos conectar. Por agora, ainda estou a perceber o que se pode fazer para isso mas é algo que devemos trabalhar em conjunto.

Sei que tem um particular apreço, não só pela cultura, na cultura pela literatura…

É verdade (risos)

Gostaria de dizer alguma coisa às pessoas que vão ler esta entrevista, algum autor de quem gostasse de falar? Gosta de poesia, não é?

Gosto de poesia! Este é o meu primeiro posto como Embaixadora e o primeiro posto é sempre um desafio, primeiro porque temos de honrar as pessoas que foram nossas predecessoras, que eu respeito muito, segundo porque é a oportunidade de representar o meu país, que é uma grande honra, e terceiro porque tudo o que se faz faz-se com amor de verdade, e nesse sentido as coisas correm bem. Quando uma pessoa faz uma tarefa como esta, que muitas vezes é longe da família, há muitos desafios. Eu penso que a poetisa que em Portugal alguns conhecem, que foi prémio Miguel Cervantes, de quem eu gosto por coincidência é Dulce María Loynaz. Há um poema que é muito conhecido dela que se chama “Amor”, e que é o relato vivido disto, do que se faz em cada momento para seguir em frente. Há uma frase final que diz “amor é ressuscitar”. Então, se o amor é ressuscitar, o que nós temos de fazer, aquelas pessoas que estão dispostas a fazer coisas por Cuba e Portugal, por esta amizade, é ressuscitar também esses esforços. Depois de tanta coisa que se passou com a pandemia, para ir para a frente, e é isso que eu tento. Às vezes na poesia encontra-se a força para seguir em frente.


Entrevista realizada por Raquel Marinho

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