Fred Jordão: “Irreverência é a marca do Carnaval”
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___________________________________________________________________________________Fred Jordão está a preparar a exposição Carnaval de Rua do Recife, que estará patente na Casa da América Latina de 10 de Abril a 6 de Junho de 2014. A Casa da América Latina falou com Fred Jordão, pedindo-lhe que explicasse melhor o conceito e a importância da exposição.
Trabalha há muitos anos na cobertura do Carnaval do Recife. O que faz deste tema particularmente cativante para si?
O Carnaval é a nossa mais importante festa popular, dá-se em todos os cantos da cidade. No Carnaval, toda a cidade se veste de fantasias e sai as ruas para cantar, dançar e brincar. É uma tradição de culto. Participo do Carnaval desde criança, primeiro a brincar e depois como fotógrafo a documentar para revistas, jornais e blogs. Durante alguns anos desenvolvi um projecto de documentação de fantasias de Carnaval na cidade de Olinda. Montava um estúdio ao ar livre e junto a outros quatro fotógrafos, e então fotografávamos as fantasias dos foliões. Era o Projeto Lambe-Lambe. Depois passei a direccionar o meu trabalho para o Carnaval mais popular, presente nas periferias da cidade. São grupos e agremiações que desfilam pela cidade e fazem brincadeiras misturando música, dança e teatro. Preocupa-me que este Carnaval esteja em risco de se transformar ou mesmo de se extinguir nos próximos tempos.
Ao longo dos anos terá certamente ouvido histórias divertidas no Carnaval. Quer partilhar alguma?
Há muitas histórias, mas as melhores são misturas de ficção e realidade. Histórias que se tornam folclóricas de fugas de maridos ou esposas para brincar ao Carnaval e só voltam no fim da festa. Ou de farras tão imensas que viram lenda e se transformam em motivo para novos encontros e daí viram blocos de sujos, alguns até se tornam tradicionais. A irreverência é sempre a marca maior do Carnaval, e está presente nos nomes de Blocos e Troças, como por exemplo: “O Homem do Cachorro do Miúdo”, ou “Formiga Sabe que Roça Come”, “Segura a Coisa que eu Chego Já”. Há também a forte presença religiosa nos folguedos de origem africana como o Maracatu, o Caboclinho e as A La Ursas.
Esta exposição contém as melhores das suas fotografias, ou o critério por detrás da escolha é outro?
Há sempre a necessidade de se criar um recorte numa exposição, por isso a escolha dá-se mais pela narrativa a ser construída, para que o espectador possa compreender do que se trata. Às vezes uma linda imagem, ou uma imagem mais dramática, não tem espaço naquele recorte. E para o fotógrafo dói que muitas fiquem de fora. Mas, para minimizar esta ausência, temos a presença do VJ Mozart que vai trazer-nos o som e outras imagens que não estão fixadas na parede. Quem for à nossa noite de abertura terá a sensação de estar no Recife, em Olinda e nos arrabaldes de Pernambuco.
O que há de especialmente atractivo na sua exposição para o público português?
Penso que a identidade brasileira estará sempre fortemente ligada a Portugal. E o Carnaval é um tempo extraordinário, onde nós permitimos esta explosão do universo sensorial, que só se dá com tamanha intensidade nos lugares onde a miscigenação de culturas se deu de forma muito intensa, como se deu no “Novo Mundo”. E penso que o Brasil é Portugal neste imaginário “Novo Mundo”. Acho que estamos sempre curiosos para descobrir quem somos ou quem poderíamos ter sido. O Carnaval do Recife é um destes momentos surpreendentes, tão cheio de alegria, e ao mesmo tempo tão pouco conhecido, que pode ser possível para os portugueses descobrirem que o Brasil e sua cultura vão muito mais além do Rio de Janeiro. Acho que vale a pena descobrir um pouco mais do nordeste do Brasil.