Lisboa – “hub” de negócios para a América Latina?
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___________________________________________________________________________________[Testemunho de Pedro Castro, Area Manager Latin America na empresa TAL Aviation Group]
Estive fora de Portugal durante 16 anos e, apesar de nunca ter vivido em nenhum país da América Latina, fui sempre chamado, com maior ou menor intensidade, a trabalhar com e para a América Latina. É caso para dizer que a América Latina está no nosso ADN de portugueses.
Não será, por ventura, a expressão mais politicamente correta a escrever numa newsletter da Casa da América Latina, mas estou seguro que qualquer leitor com o mínimo de experiência neste continente compreenderá as minhas palavras: nada é fácil na América Latina, muito menos fazer negócios. Algumas das razoes que me levam a tal afirmação são: a burocracia legal, burocracia legal, fiscal e governamental, a escassez e limitação dos recursos humanos – sobretudo ao nível no “middle management” – as fracas infraestruturas comerciais ou logísticas e, sobretudo, a baixa qualidade de vida em qualquer das megapolis deste Continente. Qualquer que seja a fonte ou lista que se tome, nenhuma cidade da América Latina surge nos Top 20 das melhores cidades para se viver no mundo, nem mesmo o tão-aclamado Rio de Janeiro.
Neste contexto, a proximidade cultural, a excelente formação, a adaptabilidade e flexibilidade tão típica dos quadros portugueses surge como um dos pontos fortes reconhecidos pelas empresas internacionais com atividades na região. Nestes anos de experiência com a América Latina, foram inúmeros os Portugueses que conheci em cargos estratégicos – na banca, no turismo ou na aviação – ora baseados em São Paulo, ora em Miami, ora mais recentemente no Panamá. Ajuda, sem dúvida, dominarmos os idiomas certos: o da maior economia do continente e o outro – na verdade, aprendemos rapidamente ou falamos sem medo em espanhol, mesmo que por vezes com erros.
Quando fui contratado por uma empresa israelita em Tel Aviv em 2011, o objetivo principal que me foi apresentado foi o de iniciar e o de desenvolver o negócio na América Latina, partindo do Mexico e descendo até à Argentina. As taxas de crescimento desse tempo ainda estavam acima da média mundial e por todo o lado crescemos tão rapidamente que o negócio se tornou difícil de gerir de Tel Aviv. Impunha-se, pois, a criação duma posição de coordenador de mercado mais próximo geograficamente. A solução de Miami – muito usada durante os anos 80 e 90 – foi posta de lado devido à acrescida dificuldade para uma companhia não americana em obter autorizações, vistos e outras “papeladas”. O Panamá – atualmente o pais da região que é menos burocrático e mais bem conectado a qualquer cidade da América Latina – poderia ser uma outra alternativa viável, mas a escassez de pessoal qualificado nesse país de apenas 3 milhões de habitantes teria imposto outras dificuldades num futuro próximo. Acresce que, para a empresa israelita, tornava-se importante que esse coordenador estivesse num país a meio caminho entre a sede de Tel Aviv e a América Latina. Iniciou-se, então, a minha campanha de criar a sede regional da América Latina em Lisboa, espécie de 1808 ao contrário: se o Rio de Janeiro já foi capital de um império Europeu, porque não modernizar esse conceito e tranformar Lisboa num hub de negocios para a America Latina 200 anos mais tarde?
Portugal, e Lisboa em particular, apresenta todos os atrativos para se tornar a sede regional para qualquer empresa em estado de desenvolvimento intermédio na América Latina:
– Quadros altamente qualificados em qualquer nível da hierarquia
– Proximidade geográfica, linguística e cultural com a América Latina e, ao mesmo tempo, guardando o espírito de trabalho, moral e mentalidade europeus
– Excelente qualidade de vida capaz de atrair quadros cujas famílias boicotam, pelas mais variadas razões, mudanças para cidades como São Paulo, México ou Bogotá.
No meu caso, este esforço de apresentação de Lisboa como uma alternativa viável fez-se sem qualquer apoio institucional e sem qualquer incentivo legal empresarial do Estado Português para iniciativas deste género. O que me moveu foi a oportunidade e o interesse pessoal de voltar para Portugal e para Lisboa. Quantas empresas necessitam, a par das estruturas próprias que tem em cada país, de um centro de coordenação de todas as atividades na América Latina, quantas empresas querem investir e crescer nessa região, mas que o querem fazer à partida de uma base europeia, quantos postos de trabalho qualificados, quantos quadros médios e superiores poderíamos “segurar” no nosso país ao serviço e em benefício da América Latina se tivéssemos, em Portugal, um enquadramento promocional, comercial e legal com o fim de promover Lisboa como “hub” não só aéreo e de passagem, mas também comercial e permanente, para América Latina? Já o fizemos no passado, será que desaprendemos as “regras do jogo” da civilização global?
Na qualidade de Area Manager Latin America baseado em Lisboa, não poderia estar mais feliz pessoal e profissionalmente – e o primeiro a beneficiar deste enquadramento é a própria empresa que acreditou em mim e em Lisboa para funcionar como o centro regional da América Latina. Que venham mais, Portugal precisa.