Entrevista a Ramón Cote: “Desde pequeno procurava Lisboa nos mapas”

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Ramón Cote Baraibar (Cucúta, Colômbia, 1963) é licenciado em História de Arte pela Universidade Complutense de Madrid. Publicou vários títulos de poesia, entre os quais se destacam Poemas para una fosa común (1984-1985), Informe sobre el estado de los trenes en la antigua estación de Delicias (1991), El confuso trazado de las fundaciones (1992), e Colección privada (2003), que recebeu o Prémio de Poesia da Casa de América de Madrid. O seu livro Los fuegos obligados foi distinguido com o 23º Prémio Unicaja de Poesia (2009). É também o editor de 10 de ultramar, uma antologia que reúne trabalhos da mais jovem poesia latino-americana (1992), e autor do livro de contos Páginas de enmedio (2002). Está publicado em diversos países e línguas, bem como em revistas internacionais.

Herdou o interesse pela poesia do seu pai (Eduardo Cote Lamus)? Que obras o marcaram inicialmente?

Desde muito jovem que lia poesia. Tive a sorte de contar com a biblioteca do meu pai, que possuía muitas obras desde o Século de Ouro Espanhol até aos anos sessenta do século passado. Nessa época Neruda e Huidobro foram determinantes na minha formação.

Estudou História da Arte. Sente que esta área tem especial influência na sua obra?

Tem uma grande influência pois não poderia viver sem poder ver certos quadros e afins, porque soube encontrar a tempo a transcrição verbal de um efeito visual, algo que para mim consistiu numa autêntica revelação. Para começar, tenho um livro dedicado exclusivamente à pintura, que se chama Colección Privada.

(E uma confissão: o primeiro Piero della Francesca que vi na minha vida, encontrei-o no Museu das Janelas Verdes [Museu Nacional de Arte Antiga] em Lisboa. Um soberbo Santo Agostinho.)

E que escritores têm influência mais direta na sua obra?

Como já mencionei Neruda, Luis Cernuda, Jaime Gil de Biedma, Claudio Rodríguez, Álvaro Mutis, Wallace Stevens, Borges, Enrique Molina, Eliot (os Quatro Quartetos), e tantos outros a quem devo a vida!!!

Tem pelo menos um poema em que fala de Lisboa (Carta Rota). Que relação teve ou tem com esta cidade?

Não tenho só um poema sobre Lisboa: tenho dois!!!!* O primeiro, Carta Rota, publiquei-o no meu primeiro livro de poemas, em 1984. Desde pequeno procurava Lisboa nos mapas e acariciava com os meus dedos os seus contornos. Saber que se chamava Olisippo, aos meus quinze anos, foi uma revelação. O título do poema tem uma explicação: originalmente era uma carta que escrevi a Fernando Pessoa e que, por desconhecer a sua morada, rasguei.

Anos mais tarde escrevi o meu segundo poema dedicado a Lisboa, que foi traduzido para português por Nuno Júdice, para grande satisfação minha. É um poema que recorda a minha primeira viagem a Lisboa, por volta de 1984, quando me alojei com um amigo num hotel extraordinário chamado Nido de Las Águilas. Não sei se existia algum, porém, das suas janelas podia-se ver uma cidade espetacular.

Qual é o seu método de trabalho?

Como disse Neruda no seu poema Entierro en el Este: “Yo trabajo de noche, rodeado de ciudad…

Que poetas da língua portuguesa lhe têm chamado a atenção?

Como para qualquer leitor, o primeiro contacto com a obra de Pessoa foi definitivo. A sua Ode Marítima e Tabacaria. Ao volante do Chevrolet pela estrada de Sintra parece-me um dos melhores poemas que já li na vida. Eugénio de Andrade é um poeta que adoro com total devoção. A sua economia de linguagem contrasta com a grande capacidade que tem de nos emocionar pelo essencial, pelo simples. Nuno Júdice li já tarde na vida, numa tradução feita no México. Como sempre acontece com as relações verdadeiras, a primeira leitura foi amor à primeira vista.

Que projetos prevê no seu futuro a nível literário?

Estou a escrever um livro de poemas que se chamará: Libro de Averías [Livro de Avarias].


* Poemas do escritor sobre Lisboa:

Carta Rota

Lisboa me debe sus labios verdes
y vino trenzado en sus murallas.
Alza tu copa profunda, asómate
escondida en tu ardiente celosía
para rodear el sueño de tus sílabas
y morder contigo la fruta sagrada.
Iza los estandartes hacia oriente,
que una aldaba golpee tres veces seguidas
cualquier puerta
y que me abra de par en par el abandono
para saber que por fin he llegado a Portugal.
Pronunciaré tu lento beso, al viento
y las jarchas caerán como ramas secas en el río.
Abre tu nombre, dulce Lisboa,
para soñar el día en que a mi sombra se la roben tus palomas.

Nido de Las Aguilas

Ya eras misteriosa desde entonces
y en los mapas antiguos te llamaban Lisabona.
En la distancia contaba tus siete colinas
como la Roma de los Césares, y me repetía
las historias de navegantes y tus leyendas de conquista.
A pesar de que nos separaba la inmensidad
del mar Atlántico, desde mi pupitre de colegio
acariciaba la curvatura del globo terráqueo,
jurando que algún día llegaría a tus orillas.

Tantas veces cortejada y celeste
apareciste ante mis ojos un día de verano
de 1984, cuando te vi desde el cuarto
del Nido de las Águilas,
un hotel angosto y suicida
que se santigua en el cerro de San Jorge
cada vez que amanece Lisboa.

Un mapa por años doblado y desdoblado
ardió de víspera y de espera
sobre miles de peldaños, ardió sobre las plazas,
sobre la constante pendiente
de sus calles, sobre su zozobra marina,
y lo arrojamos desde un puente
para que fuera el azar la única brújula que nos orientara.

Intento mirar los días desde entonces
como si estuviera desde una ventana del cuarto
del hotel del Nido de las Águilas,
viendo por primera vez cómo amanece
la fragante, la profunda, la ondulada
ciudad de Lisboa.

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