Lisboa respira a América Latina por três dias

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Com o objectivo de aproximar os cidadãos latinos que residem em Portugal e de dinamizar a sua interacção com a população local, o Alto do Santo Amaro em Alcântara acolheu durante três dias a primeira edição do Festival Enlaces.

“É uma alegria para nós ver o Enlaces a acontecer, apesar das dificuldades que tivemos que enfrentar. Que esta seja a primeira de muitas edições”, disse Manuela Júdice, secretária-geral da Casa da América Latina durante a sessão de abertura. Uma vontade partilhada por Carlos Castro, vereador das Relações Internacionais da Câmara Municipal de Lisboa, que enfatizou a “necessidade de afirmação do festival” para que este se prolongue “por muitos anos”.

“Esta é uma freguesia de todos e para todos, e com o Enlaces esperamos que ainda seja para mais gente”, disse Davide Amado, presidente da Junta de Freguesia de Alcântara. Por seu lado, Sandra Ramirez enalteceu o apoio de todos os envolvidos na iniciativa. “Este é um dia importante para a cultura latino-americana, que mais uma vez se vê tão bem recebida e acolhida pelos portugueses”, afirmou a representante da Associação Enlaçart.

Ao todo, o Festival Enlaces reuniu onze países da América Latina, que se serviram de cerca de 20 stands para expôr a sua música, gastronomia e arte. Junto da Capela de Santo Amaro, um palco com vista desafogada sobre o Tejo apresentava uma programação cultural bastante diversificada.

Logo no primeiro dia, Giana Viscardi subiu ao palco para apresentar a Lisboa os ritmos quentes de “Orum”, o seu mais recente disco. Numa fusão original, que junta a música brasileira aos ritmos africanos, Giana Viscardi, Cauê Silva e Gustavo Marques conquistaram o público que ali se juntou para celebrar a América Latina.

Luis Fretes Carreras, ex-embaixador do Paraguai em Portugal, considera que o Enlaces reflecte a continuidade de um trabalho já existente no que se refere a uma aproximação entre Portugal e a América Latina. “Este evento apresenta de forma “sofisticada” a nossa cultura, pois tem o melhor da música, da comida e das artes. É uma forma de valorização nesta sociedade. Quando era embaixador apoiei essa iniciativa e como cidadão celebro”, completou, enquanto Giana cantava no palco.

A celebração regressou no segundo dia com o Dúo Passim, de Jacque Falcheti e Flávio Vasconcelos, considerados, na opinião de Maria Xavier, programadora cultural da Casa da América Latina, a revelação do festival: “É uma alegria descobrir talentos e mais ainda revelá-los”, disse. Os dois encantaram o público com apenas voz, um pandeiro e um violão, tendo apresentado músicas próprias e alguns clássicos da MPB. A tarde aqueceu com a banda do venezuelano Diego Gil-Fortoul, que entre a world music, o pop e a música alternativa, tocou faixas do seu primeiro trabalho a solo “A prueba de bala”. A noite foi marcada pela energia de Cylene Araújo, diretamente do Recife para o Alto de Santo Amaro. A cada ritmo do nordeste brasileiro, Cylene surpreendia o público com o figurino correspondente. Do xote ao forró, a brasileira fez jus à alcunha de “diva do forró” e pôs toda a gente a dançar.

Mas nem só de música se fez o Enlaces e os mexicanos Chapulines mostraram que dançar é com eles. O primeiro grupo folclórico mexicano em Portugal – e provavelmente o mais colorido – não descansou enquanto não deixou o público de sorriso estampado no rosto. No domingo, terceiro e último dia do festival, foi a vez do grupo português Tango na Rua fazer frente ao calor da tarde para espalhar charme e paixão na Capela de Santo Amaro. Cerca de duas dezenas de pessoas dançaram ao som do tango argentino, momento que deu o mote para o encerramento em comunhão do festival.

Paralelamente ao rebuliço musical, países como Cuba, Uruguai, Perú, Argentina, Brasil, entre outros, exibiram durante três dias o mais diverso artesanato latino, bem como a rica e famosa culinária da região. Uma opção que revelou ser um sucesso junto do público presente. “A ideia é boa e a organização está de parabéns pois conseguiu distribuir bem os espaços, possibilitando um passeio agradável”, disse José Brandão, português casado com uma brasileira de Curitiba que vive em Portugal há 15 anos.

Já Enrique Williams, da Argentina, considera que eventos como o Enlaces são importantíssimos, já que constituem uma oportunidade para “apresentar as empanadas e o vinho do meu país”. E apesar de confessar que “faria muita diferença” haver uma maior participação das embaixadas, Enrique diz-se “feliz com o evento” do qual faz um balanço geral “positivo”.

Uma das representantes do stand gastronómico do Peru, Inocência Quiñones, também felicitou a iniciativa, mas acredita que as próximas edições têm tudo para melhorar. “Estou contente, não tenho do que me queixar, talvez do sol, que levou muita gente para a praia, mas é certo que durante a noite temos muito mais público por aqui”.

O cubano Hans Varela – residente em Portugal há 16 anos e responsável por um stand de artesanato cubano – comenta: “Seria bom repetir mais vezes, pois assim é possível unir o povo português à nossa cultura. Para começar, estamos a vender bem. Além dos famosos charutos cubanos, temos música e artesanato que muita gente ainda não conhecia”.

As culturas latino-americanas estenderam-se à poesia. Na tarde de sábado, a sessão Nuestra Poesía, iniciativa da embaixada da República Dominicana, contou com a leitura de poemas por diplomatas, entre eles Carla Tarditi (da embaixada da Colômbia), José Manuel Cuevas (da embaixada do México, Kenia Liranzo Nuñez (da embaixada da República Dominicana) e o próprio Embaixador da República Domincana, Jaime Durán, além de Sandra Ramirez (da Associação Enlaçart) e Miguel Sopas (actor português). Eduardo Galeano, Franklin Mieses Burgos, Octavio Paz ou Lourdes Espínola foram alguns dos poetas ali evocados. Maria Xavier (da CAL) convidou o público a juntar-se à “roda de leitura”, distribuindo poemas para escolha dos leitores. No fim, ficou a intenção de se juntarem mais vezes para partilharem o rico património poético da América Latina.

O balanço é, para a organização, voluntários e todos os participantes, bastante positivo. Com motivos para celebrar e alguns aspectos para melhorar, o que fica é mesmo o enriquecimento cultural e a intensa troca de culturas que se proporcionou durante o Festival Enlaces. “Estes três dias demonstraram que, apesar das dificuldades, o diálogo é o principal ingrediente para o sucesso deste festival. Nunca o trabalho com estas entidades foi tão coeso e isso deve-se de facto a cada uma das pessoas que ajudaram a tornar este Festival Enlaces numa realidade, e que esperamos que possa voltar no próximo ano”, afirmou Diana Lopes, assistente de programação da Casa da América Latina.

Fica também o reconhecimento pelo trabalho entre as equipas da Casa da América Latina, da Junta da Freguesia de Alcântara, da Câmara de Lisboa e da Associação Enlaçart, só possível graças ao apoio dos voluntários Valéria Ibalo, Marcela Medina, Miguel Medina e Maite Chaves, a quem agradecemos especialmente.

Finalmente, um agradecimento às equipas técnicas e aos artistas, artesãos, cozinheiros e ajudantes que aceitaram participar, contribuindo assim para a construção de um verdadeiro enlace.

Escrito com a colaboração de Valéria Ibalo.

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